Tudo do Velho no Novo



Ano novo, vida nova! Será mesmo? Em 2006 acompanhamos a repetição de inúmeros problemas ocorridos no ano anterior, ou melhor, nos anos, décadas e séculos anteriores. Há perspectiva de sensíveis mudanças para 2007?

Um dos fatores pelos quais podemos acreditar em mudanças são as alterações nos comandos de diversos executivos estaduais. Por exemplo, no Rio Grande do Sul, no Rio de Janeiro e na Bahia, assumem novos governadores. Neste pago, algumas medidas drásticas estão sendo anunciadas. Mas o que se percebe é o desejo da governadora eleita em corrigir distorções orçamentárias, embora utilizando soluções que sempre terminam por onerar aqueles já repletos de obrigações tributárias. Corretos ou não, o tempo responderá sobre estes remédios. Em terras baianas, anuncia-se a agonia do carlismo, cujo representante, que empresta nome à arcaica ideologia, foi politicamente derrotado nas últimas eleições. E no Rio há grande expectativa sobre como será tratado, a partir de então, seu mais grave problema, o da segurança pública.

Da anterior autoridade máxima da pasta, ouvimos, perplexos, declaração que expõe a situação calamitosa da segurança pública fluminense. Após operação criminosa que vitimou a Presidenta e o Vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministros Ellen Gracie e Gilmar Mendes, o digno Secretário saiu-se com essa: as autoridades judiciárias deveriam anunciar às autoridades policiais cariocas sua chegada na Cidade Maravilhosa. Faltou dizer como fariam outros milhões de cidadãos que não podem ser qualificados de autoridade. Acaso solicitem proteção policial para deslocarem-se de um dos aeroportos a qualquer outro local da capital carioca, serão atendidos? E a ampla maioria que não viaja, muito menos de avião? Se houver negativa, qual será o motivo? Por que logicamente não há efetivo para proteger individualmente os cidadãos, ou por que o solicitante não é autoridade? Melhor não indagar o Sr. Secretário, afinal, com sua concepção de segurança pública, é capaz que determinasse nossa prisão por desacato.

Talvez resida aí o problema no trato das questões públicas no Brasil. Alguns eleitos acreditam que por conta disso estão autorizados a fazer o que bem entendem. Não têm noção que são mandatários de anseios populares, e não escolhidos por alguma entidade divina que torne seus atos insuspeitos ou não sindicáveis por quem quer que seja. Mais do que um resquício da República dos Generais, parece ser uma característica intrínseca dos nossos governantes, desde as capitanias. Daí por que duas coisas não falham neste país, a lógica do “sabe com quem está falando?” e a do “jeitinho”, desde que, obviamente, utilizadas em benefício de quem pode mais.

Se este raciocínio estiver correto, então podemos esperar bons governos por parte daqueles que têm espírito público, não no sentido de tornar seu o que é de todos, mas que não confunda o que é seu com o que é de todos. É exigível noção de que qualquer cargo público deve ser exercido em benefício da sociedade, e não de interesses particulares ou individuais. E isso importa em evitar a cobiça por bens materiais e promoções pessoais. Quando o agente está orientado por princípios e valores correspondentes às aspirações da sociedade, gozará sempre de amplo apoio de sua consciência e daqueles conhecedores de seus compromissos, ao contrário daquele que deve um favor aqui outro ali, comprometendo-se com objetivos anti-republicanos e, no mínimo, escusos.

Enfim, respeito ao cidadão! É essa a fórmula mágica. Voltando ao exemplo carioca, observamos que foi exatamente isso que o governo que se despede não fez. A declaração do seu Secretário de Segurança apenas terminou por profetizar os eventos que tristemente acompanhamos nos últimos dias. Somente na madrugada do dia 28, dezoito pessoas foram mortas. Sem capacidade gerencial e compromisso com a seriedade, venceu a violência decorrente da criminalidade.

Não obstante, há promissoras novidades trazidas pela brisa carioca. Decerto a nomeação de profissional vinculado à Polícia Federal não é certeza de sucesso na área, contudo demonstra o empenho do atual Governador em tentar minimizar as mazelas. Ou evitar declarações absurdas que refletem a incapacidade de apresentar soluções. Igualmente a designação de conhecedor do assunto, como no caso gaúcho, ao contrário de um mero compadre político, merece aplauso.

Espera-se dos novos governantes que se voltem aos cidadãos. Enquanto estão vivos. Eventuais lágrimas de crocodilo não ressuscitarão os mortos ou conformarão familiares e amigos. É possível que um simples meneio de cabeça seja suficiente para desfrutarmos de um ano melhor. Caso contrário, só um milagre. Milagre, aliás, que, esperamos, atinja também os reconduzidos. Feliz 2007!

Gerson Godinho da Costa
Juiz Federal
Diretor Cultural da AJUFERGS



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