Pobres Ministros



Mais uma colocação do Presidente da República causa polêmica. Referiu o chefe do Poder Executivo federal que os Ministros de Estado são heróis, porque abandonam suas atividades profissionais, em razão das quais são melhores remunerados, para exercer o posto de autoridade máxima dos diversos Ministérios da República.

O problema todo está na forma em que externou sua opinião, o que não constitui nenhuma surpresa, tendo em vista que não é a primeira vez, muito menos deverá ser a última. De qualquer maneira, não se afigura correto demonizar essa declaração. Isso porque sob a infeliz fórmula em que proferida, no fundo contém algum fundamento, por mais paradoxal que possa parecer.

Primeira constatação, a qual desmente que os Ministros da República sejam heróis; segunda constatação, dependendo dos parâmetros de análise, de fato os Ministros da República não percebem remuneração condizente com a importância do cargo. Examinemos cada qual de forma mais aprofundada.

É possível que muitos dos escolhidos para qualquer Ministério possam ganhar menos, enquanto no cargo público, do que em suas atividades de origem. Há muitos advogados, empresários, economistas, médicos de sucesso cujos rendimentos são muito superiores aos daqueles percebidos por um Ministro. Mas isso não significa, automaticamente, que sejam heróis.

Se o encargo fosse tão pesado, haveria tantas disputas entre possíveis ministeriáveis? Observaríamos a administração ser fatiada entre os partidos políticos em troca de apoio ao governo? Não seria o Presidente que deveria rogar ao escolhido para que assumisse tão dura incumbência, ao invés de assistirmos o constante beija-mão que redunde em apoios concretos na busca de tão almejado cargo? Se o Ministério fosse missão para heróis, provavelmente as respostas seriam negativas. Mas assim não é.

É não é por razões muito simples. Ser Ministro é exercer poder e influência. É dispor de dinheiro (muito ou pouco, dependendo da pasta) para fazer funcionar (bem ou mal) a máquina pública. É estar constantemente exposto na mídia. É conhecer questões de governo que podem ser úteis para suas atividades particulares, etc. Convenhamos, não é pouco. Podemos arriscar a dizer que o que menos interessa aos ministeriáveis é a remuneração.

Ainda que o atrativo se resumisse ao salário, é forçoso admitir que não é nem um pouco desprezível, especialmente se considerarmos as diversas vantagens recebidas pelos Ministros republicanos, como por exemplo, residência oficial, motorista particular, viagens custeadas pelo orçamento público etc. Mais uma vez, convenhamos, não é pouco. Isso sem falar nos ‘jettons’, consistentes em significativas parcelas de dinheiro por participarem de conselhos administrativos de autarquias, fundações e empresas públicas e sociedades de economia mista.

Mais. Se a administração do Ministro não for um retumbante fracasso, depois de deixar o cargo, passa a ser convidado para proferir palestras e assessorar grandes grupos econômicos. Nenhuma crítica a essas faculdades. É da natureza da relevância do cargo. Para que não se pareça preconceituoso, sugerindo que isso é coisa de político brasileiro, basta referir que o norte-americano Bill Clinton enriqueceu depois de deixar a Casa Branca, com as inúmeras conferências para as quais foi contratado.

Não obstante todas essas vantagens, reveladoras, aliás, da importância do cargo, os Ministros devem ser bem remunerados. Todo bom profissional merece ser bem pago. Trata-se de diretriz observada em qualquer lugar que deseja privilegiar e manter seu empregado sob pena de perdê-lo. A título exemplificativo, é grande o número de trabalhadores qualificados que, sem estímulo no Brasil, têm sido muito bem recebidos no exterior.

A comparação com os salários pagos a outras atividades, portanto, é inadequada. É especialmente equivocado o cotejo com o salário mínimo. Não é preciso pensar muito para constatar que oito mil reais são muito melhores do que trezentos e cinqüenta reais. Entretanto, não são aqueles milhares que são muito, essas poucas dezenas é que são pouco.

Enfim, mesmo que o salário de Ministro não corresponda à importância do cargo, não significa considerar os escolhidos pelo Presidente da República como heróis. Que proponha o aumento que entender cabível e justifique sua intenção na relevância das atribuições ministeriais.

É mais conveniente chamar de heróis os médicos e enfermeiros do Sistema Único de Saúde, os policiais e professores gaúchos, os mais diversos técnicos do funcionalismo público, profissões essas que, embora relevantes – ainda que não se comparem às funções dos Ministros –, permanecem com remuneração muito aquém do razoável.

Gerson Godinho da Costa
Juiz Federal
Diretor Cultural da AJUFERGS



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