Prêmio a Delinquência Organizada
No dia 07 de julho de 2007, nesta coluna, foi afirmado que o “princÃpio da presunção da inocência é sem dúvida uma das construções jurÃdicas mais importantes da humanidade”, sendo impossÃvel dissociá-lo do Estado Democrático de Direito.
E prosseguia: “No entanto, como qualquer outro princÃpio, não é absoluto, devendo ser relativizado, especialmente nas hipóteses em que é utilizado de forma abusiva. Nestas situações, aliás, o próprio princÃpio resta desnaturado. Afinal seu objetivo é preservar os indivÃduos de decisões arbitrárias baseadas na afobação, sem que seja possÃvel exercer qualquer defesa. Jamais sua finalidade foi assegurar a impunidade dos ilÃcitos”.
Mais adiante: “Existem recursos que não admitem a discussão da prova. Entre eles está o recurso extraordinário, apreciado pelo Supremo Tribunal Federal, que somente pode ser apresentado quando a decisão afrontar a Constituição Federal. Imaginemos que alguém é condenado pelo juiz por que cometeu um crime, estando a decisão baseada no depoimento de várias testemunhas e diversos documentos. O condenado recorre ao tribunal, que, julgando seu recurso, conclui exatamente o mesmo que o juiz. Esse sujeito pode ainda interpor o recurso extraordinário, mas o Supremo não avaliará se o juiz e o tribunal concluÃram corretamente sobre as provas, somente dirá se a lei em que eles se basearam é constitucional”.
“É óbvio que esse julgamento do Supremo é importantÃssimo. Deixa de sê-lo, no entanto, quando o próprio Supremo já tem decisões apontando que o recurso extraordinário daquele condenado não será acolhido. O que acontece então? Basta que o Supremo diga que o recurso não tem cabimento, para ocorrer o chamado trânsito em julgado”.
“Ocorre que por inúmeros motivos o Supremo não consegue proferir essa decisão em tempo razoável. Enquanto isso, sob o argumento da presunção da inocência, a sociedade assiste ao espetáculo da impunidade, aguardando apenas a formalidade da decisão cujo resultado já é sabido”.
“A presunção de inocência, portanto, tem se prestado a uma das mais censuráveis e lamentáveis manipulações do processo, a chamada protelação das decisões. Nestes casos o objetivo não é provar a inocência do cidadão, mas empurrar o processo o máximo possÃvel, até que não possa mais ser aplicada a punição”.
Pois o Supremo acaba de chancelar exatamente essa interpretação ao não mais admitir a execução provisória da pena – anteriormente referendada pela própria Corte –, depois de confirmada a condenação em nÃvel recursal e interposto pelo condenado o recurso especial e/ou extraordinário. Importa ressaltar que não é a única interpretação, tanto que alterada a jurisprudência, e pelo fato de dois Ministros divergirem da solução majoritária. E seria leviano afirmar que essa conseqüência fosse almejada pelo entendimento vencedor, mas os julgadores estavam cientes dela, posto que alertados pelo Ministro Joaquim Barbosa.
Ponto para a criminalidade do colarinho branco. Afinal, a galera dos sem colarinho ou com colarinho sujo e puÃdo – com seus furtos de carteira, tráficos de esquina e estelionatos de botequim – não tem grana suficiente para assegurar a presunção perante o Supremo, deliberadamente conduzindo seus processos à prescrição.
Gerson Godinho da Costa
Juiz Federal
Diretor Cultural da AJUFERGS