Decisão judicial se discute



Qualquer pessoa sensata concorda que as décadas de exercício do poder político pela família Sarney no Maranhão não contribuíram em praticamente nada para a melhora dos indicadores sociais. Se não está no lamentável topo, certamente é um dos mais pobres entre os Estados que compõem a federação.

Exatamente por essa inocuidade gerencial, cujos críticos mais exaltados chegam a afirmar que os resultados das gestões revertem em benefício apenas do próprio clã e de seus aliados, muitos desejam o insucesso desse grupo político. No entanto, torcer não significa admitir qualquer espécie de postura que ingresse ou tangencie a ilegalidade.

O Tribunal Superior Eleitoral – TSE declarou que houve irregularidades na campanha do governador então no cargo e decidiu afastá-lo. Decidida a questão, ‘cumpra-se’. Mas há significativa distinção entre cumprir e consentir. Qualquer pessoa, sucumbente parcial ou totalmente num processo judicial, deve cumprir o que foi determinado, mas não precisa concordar com o que foi decidido.

Essa discordância, utilizada nas instâncias adequadas e pelos meios admitidos, contribui não somente para o aprimoramento da função jurisdicional, mas também e especialmente para a consolidação da democracia. Juízes não são infalíveis. E mesmo que o fossem com relação à determinada época, local e segmento social, não se deve esquecer que os valores se encontram em constante mutação, e uma decisão que se apresentava perfeita em determinado momento pode não o ser em outro que lhe seja posterior.

Por intermédio das constantes indagações, discussões e necessárias correções é que o Direito evolui. E esse princípio, que recomenda a inextinguível confrontação de fundamentos, deve valer com relação a qualquer instância ou órgão judicial.

Por isso, o governador afastado e seus correligionários não estão obrigados a concordar publicamente com a decisão. Se entenderem conveniente, podem contribuir com a apresentação de argumentos que refutem aqueles adotados pelo TSE. Há uma infinidade de espaços onde podem se manifestar. E aqui ou acolá poderão ser estabelecidas novas balizas com base nas quais, futuramente, o Tribunal possa decidir de forma diferente.

O que não se deve admitir é que a inconformidade se traduza pura e simplesmente em descumprimento da decisão judicial. Esse tipo de postura, além de em nada contribuir para a democracia, estimula setores dispostos a concretizar a bagunça generalizada ou a perpetuar os cenários de flagrantes injustiças, situações certamente indesejadas por aqueles que se preocupam com a construção de um país mais justo socialmente.

Gerson Godinho da Costa
Juiz Federal
Diretor Cultural da AJUFERGS



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