Aumento para os congressistas, sim



O título deste artigo pode parecer provocativo. Mas não é. Também não tem por objetivo chamar a atenção do leitor. Apenas reflete uma idéia que, paradoxalmente, pode resultar em benefício do interesse público. Vejamos.

A Constituição Federal atualmente estabelece um teto remuneratório para o serviço público. Esse limite não pode ser ultrapassado exceto nas hipóteses em que o pagamento é efetuado a título indenizatório ou quando a verba não integra os vencimentos. Parece pouco, mas essas duas exceções autorizam um sem número de variantes descontroladas que possibilitam o apossamento do patrimônio público em benefício indevido do patrimônio privado.

Por conta dessa brecha, que já se tornou um boqueirão, exclui-se da limitação constitucional, por exemplo, verbas para passagens aéreas, para o pagamento de despesas de gabinete, para correspondência, etc. Muito conveniente para pulverizar o controle dos gastos públicos. Apenas eventualmente – e não nos enganemos, de fato apenas eventualmente – é que ao respeitável público é dado conhecer esse derrame incontrolado de verbas, como recentemente aconteceu com a farra aérea. Alguns congressistas acreditaram que o céu era de ninguém. Erraram. Ainda assim, em mar, essa é apenas a ponta do iceberg. Difícil acreditar que toda massa de gelo flutuante se revele em sua integralidade.

Não se adere aqui, entretanto, a falsos proselitismos morais. Deputados e senadores exercem papel de significativa importância no estado democrático de direito. Por isso, a eles deve ser assegurada atuação, tanto quanto possível, independente, o que pressupõe remuneração compatível com a relevância da função.

Remuneração compatível, contudo, não é sinônimo de descontrole público. Pelo contrário. É aí que a mensagem explicitada no título encontra sua razão de ser. Os congressistas merecem aumento, sim. Aumento que os autorize, com a remuneração, enfrentar todas as despesas referentes ao exercício da suas funções. Por outro lado, isso autorizará que todo e qualquer brasileiro saiba exatamente quanto recebe um congressista. Já se notará aí sensível evolução, já que, atualmente, pouco se sabe, senão que a remuneração estabelecida em lei está muito aquém do que é efetivamente percebido com as várias e desconhecidas vantagens pessoais.

O fato de atualmente não nos sentirmos, em geral, minimamente bem representados no Congresso Nacional não pode servir de justificativa para a desqualificação desse órgão que já prestou essenciais serviços à democracia. O que é preciso é torná-lo submisso novamente aos interesses públicos. O aumento dos vencimentos pode contribuir para essa nova relação de transparência.

É preciso estar consciente, ainda assim, de que essa medida não será suficiente. Fundamental é não esquecer que os congressistas lá estão por força do voto popular. E é neste ponto que mudanças substanciais são francamente desejadas.

Gerson Godinho da Costa
Juiz Federal
Diretor Cultural da AJUFERGS



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