Vivemos outros tempos



O Superior Tribunal Militar - STM é composto por quinze ministros, sendo que dez deles são oficiais-generais provenientes das Forças Armadas e os outros cinco, civis. É o que estabelece o art. 123 da Constituição Federal.

Por conta da vida profissional exercida na caserna, naturalmente rigorosa, é provável que os ministros de origem militar mantenham posturas mais rígidas, ademais por que não lhes é exigida formação na área do direito. Portanto, naquela Corte, os componentes civis têm o papel de conformar as decisões à técnica jurídica e de flexibilizar a austeridade militar.

Curiosamente, no entanto, o Presidente do STM, Ministro Carlos Alberto Marques Soares, apresentou declarações não condizentes com o papel constitucional que lhe foi atribuído. Juiz auditor, ocupa vaga destinada aos civis. Contudo, falhou na consideração do direito e tampouco atuou habilmente no acerto das visões contrapostas.

Errou ao desqualificar decisão judicial proferida pela primeira instância da Justiça Federal. Sugerir que juízes são interventores ou que não têm coragem de trancar ações penais é, no mínimo, alegação lamentável. Parece ter esquecido que acima do Código Penal Militar e do Estatuto das Forças Armadas encontras-se a Constituição Federal.

Constituição esta que admite, segundo interpretação do Supremo Tribunal Federal a respeito do art. 142, § 2.º, o cabimento de hábeas corpus para averiguação da legalidade da punição disciplinar. Logo, se o ato castrense desbordou do estabelecido em lei, cabe hábeas corpus, cujo processo e julgamento incumbe à Justiça Federal. Isso não é o magistrado criticado quem diz. É a própria Constituição. O que nunca é demais reiterar, pois ainda há quem pense que a Constituição não passa de mera perfumaria.

Aliás, também está previsto na Constituição que ao Conselho Nacional da Magistratura compete examinar questões relacionadas ao não cumprimento dos respectivos deveres pelos juízes. Pois o Estatuto da Magistratura, ainda que sob o qualificativo de anacrônico, veda a manifestação sobre decisões judiciais, especialmente aquelas depreciativas. Cumpre indagar o que será melhor para a sociedade, sob o argumento de preservar a disciplina nas Forças Armadas admitir então a desobediência dos diplomas legais que regem os atos de todos, sejam civis ou militares?

Como vivemos em Estado Democrático de Direito, cuja evolução e aprimoramento não podem ser descuidados em qualquer momento e sob qualquer hipótese, sorte nossa contar com instituições dispostas ao enfrentamento daqueles que pensam estar acima da Constituição.

Nesse enfoque, a Associação dos Juízes Federais do Rio Grande do Sul, pela autorizada palavra de seu presidente, Gabriel Wedy, externou sua insatisfação com declarações dessa espécie, denotando que manifestações infelizes não são suficientes para desestabilizar os juízes federais gaúchos quanto ao compromisso de defender a Constituição.

Gerson Godinho da Costa
Juiz Federal
Diretor Cultural da AJUFERGS



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