ENTRE NÚMEROS E DIREITOS



O Conselho Nacional de Justiça – CNJ tem adotado medidas interessantes no exercício de suas atribuições. Algumas perfeitamente criticáveis, outras, elogiáveis. Faz parte. Trata-se de instituição recentemente criada, e leva tempo se acomodar até sua consolidação histórica.

Expor à sociedade informações a respeito do funcionamento do Poder Judiciário, por exemplo, é uma necessidade da democracia. De outro lado, impor aos magistrados o preenchimento infindáveis formulários para fins estatísticos e de controle, exigências que mais confundem do que propriamente auxiliam, é questão que deveria ser discutida com maior profundidade e cuidado.

Há também algumas políticas sobre as quais não se pode, previamente, proferir juízos desinteressados. É o caso da chamada “Meta 2”. Ela recomenda que todos os processos ingressados até o final de dezembro de 2005 devam ser julgados ainda no ano corrente. Considerando que uma ação ajuizada em agosto de 2005, acaso definitivamente julgada em agosto de 2009, esteve em tramitação por quatro anos, convém reconhecer que a “Meta 2” está longe de ser absurda ou desnecessária. Pelo contrário, pois estabelece uma prática óbvia para o cumprimento do princípio constitucional que preconiza a “duração razoável do processo”. É copioso invocar a sempre citada expressão atribuída a Rui Barbosa, mas de fato justiça tardia não é justiça.

Mas se no plano genérico ou abstrato a medida se mostra inteligente, é preciso examinar as circunstâncias de cada processo. Afora deformadas e infelizes exceções, em regra há problemas alheios à dedicação do juiz para que um processo ajuizado no ano de 2005, ou mesmo antes, ainda não tenha sido definitivamente julgado. Comumente a vara ou colegiado onde tramita está abarrotada de outras ações, as quais são contadas aos milhares. Também a natureza complexa do processo ou a atuação protelatória de alguma das partes determinam a delonga.

Se a “Meta 2” se limitar a corrigir eventuais distorções, identificando onde, como e por que a tramitação dos processos é muito demorada, acelerando o julgamento, certamente os ganhos serão incalculáveis. Será nítida sua contribuição para a transparência da atuação do Poder Judiciário.

Mas é indispensável para seu sucesso que não se confunda a prestação jurisdicional com outras relações sociais, como a compra de um automóvel ou telefone celular. Uma decisão judicial normalmente afeta sobremaneira a vida de uma pessoa ou o desenvolvimento de uma empresa, seus efeitos podem ser inicialmente intangíveis, mas normalmente causam sensível repercussão em diversos setores da sociedade. Não pode ser tratada como criação de uma linha de montagem de produto eletrodoméstico.

Certamente essa equação é dificílima. Equilibrar o objetivo de celeridade de julgamento sem, ao mesmo tempo, perder a atenção que merece o jurisdicionado é tarefa nada fácil. De qualquer modo, não há como fugir dessa cautela, sob pena de considerar a “Meta 2” como mera consagração formal de números em detrimento da qualidade dos julgados e das pretensas soluções justas que visam transmitir.

Gerson Godinho da Costa
Juiz Federal
Diretor Cultural da AJUFERGS



ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES FEDERAIS DO RIO GRANDE DO SUL
Rua Manoelito de Ornellas, 55, Trend City Center - Torre Corporate, sala 1702, Praia de Belas - Porto Alegre, RS, CEP 90110-230.
(51) 99965-1644
ajufergs@ajufergs.org.br