A Primavera do Cairo



Neste ano a primavera chegou mais cedo ao Oriente Médio. Após 30 anos no poder, o ditador Hosni Mubarak caiu. Como na Primavera de Praga, em 1968, o povo foi às ruas para derrubar o regime. Porém ao contrário de então, quando tanques soviéticos esmagaram a revolução popular, no Egito tudo depende apenas dos próprios egípcios, que podem dar um novo rumo a seu país e servirem como uma espécie de farol democrático para o restante do mundo árabe.

E nada melhor do que o exemplo da Praça Tahrir para dar a direção naquilo que se espera seja uma nova etapa para o país. Em uma brava odisséia de 18 dias, manifestantes contrários ao regime resistiram a todos os mecanismos usados para reprimi-los: desde a violência da polícia, passando pelos ataques de milícias até à mentirosa propaganda feita pela mídia controlada pelo governo. Com admirável persistência e coragem, venceram pela força moral de sua causa e de sua atitude.

No Egito, a magnificiência das pirâmides e a beleza calma do Nilo sempre contrastaram com a miséria da imensa maioria dos que vivem naquele país. E os 30 anos de Mubarak no poder contribuíram apenas para o agravamento desse quadro: hoje quase a metade dos egípcios sobrevive com menos do que o equivalente a R$ 100,00 por mês. Já a fortuna do ditador, como se sabe, estaria estimada entre as maiores do mundo.

Se a queda de Mubarak levará à melhoria das condições de vida do povo egípcio e à democracia, só o tempo pode dizer. E embora sua saída tenha sido certamente um grande passo nessa direção, é bom lembrar que o poder ainda está nas mãos de homens que conquistaram seus cargos como homens de confiança do ex-ditador e que eram peças-chave no antigo regime. Além disso há relatos de violações dos direitos humanos acontecendo no país mesmo após o 11 de fevereiro.

Outra incógnita é se o efeito Túnis-Cairo levará à queda de outros regimes autoritários na região. Protestos na Líbia, Irã e Bahrein têm sido duramente reprimidos. E a repercussão internacional dos protestos, que teve um papel decisivo no caso do Egito, deve ter um impacto muito menor no caso de países como Líbia e Irã, tradicionais párias da comunidade internacional.

Mas se alguma lição pode ser tirada dos extraordinários eventos dos últimos dias é que um único homem - no caso um simples feirante de uma pequena vila na Tunísia - pode mudar o mundo, e que nenhum povo está condenado a viver eternamente sob o jugo de um governo tirano e corrupto. E talvez - e coloque-se aqui um grande talvez - a era dos autocratas possa estar próxima do fim.

Gueverson Farias
Juiz Federal



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