A debilidade do poder judiciário



O Poder Judiciário é o último refúgio dos cidadãos. A última esperança daqueles que têm a sua liberdade ameaçada, a sua propriedade agredida, os seus direitos violados.

É um poder de extrema importância. Mas, infelizmente, é um poder que tem se mostrado fraco. Ele não dispõe da força pública, que cabe ao Poder Executivo. Não dispõe do poder de criar direitos e estabelecer obrigações aos cidadãos, incumbência do Poder Legislativo. E sequer dispõe de apoio político e popular.

Daí os frequentes problemas de efetividade das decisões judiciais. Os precatórios judiciais que Estados e Municípios não pagam. Os mandados de prisão e de reintegração de posse que a polícia não cumpre.

No entanto, o ônus político do descumprimento das decisões judiciais sempre recai sobre o Poder Judiciário. Para a opinião pública, é o Judiciário que não paga os precatórios. É o Judiciário que não prende os criminosos. É o Judiciário que não restitui a propriedade ao seu titular. É o Judiciário, em suma, que não funciona.

E não é só isso. Os juízes são obrigados a aplicar as leis tal como elaboradas pelo Congresso Nacional. Quando políticos comprometidos com lobistas (leia-se: corruptos eleitos pelo povo) concedem benefícios injustificáveis para criminosos, os Juízes têm de aplicá-los. Têm de suspender processos contra sonegadores que aderiram a generosos programas de parcelamento instituídos pelos legisladores. Têm de declarar a extinção do direito de o Estado punir crimes pela ocorrência da prescrição, pois o legislador instituiu aberrações jurídicas como a chamada “prescrição retroativa”, instituto a serviço da impunidade que não encontra paralelo algum no direito comparado - e que recentemente foi atenuado, mas não extinto.

É certo que nós, os Magistrados, podemos interpretar as leis e afastar a sua aplicação quando elas violam a Constituição. Nisso encontramos um significativo espaço para realizar a justiça e preservar os direitos fundamentais dos cidadãos.

Tal espaço, contudo, é limitado, sobretudo pela vinculação dos Juízes à jurisprudência dos Tribunais superiores, compostos por nomeações políticas, que não veem vício algum nos institutos destinados a assegurar a impunidade, como a prescrição retroativa e a “absolvição” dos sonegadores que, para livrar-se do processo penal, quitam ou parcelam o débito logo que são flagrados pelo Fisco.

O Poder Judiciário também é fraco porque não pode fixar a remuneração dos seus membros e sequer tem força política para ver aprovada uma política remuneratória minimamente racional. Os Magistrados são avessos a conchavos políticos e a manifestações públicas de indignação. Não realizam articulações sindicais, que o Governo Federal está tão habituado a ouvir e acolher.

Portanto, com frequência veem subordinados ganhando subsídios superiores aos seus; veem outras carreiras, cuja responsabilidade é infinitamente inferior à sua, serem agraciadas com reajustes reais e direitos que não lhes assistem; veem advogados e juristas comprometidos politicamente serem nomeados para a cúpula do Poder Judiciário; veem direitos básicos cassados por canetaços. Veem tudo isso e nada fazem. Nada além de protestar silenciosamente, de emitir notas à imprensa, de conversar com políticos que não querem abraçar a sua causa, pois ela não os beneficia.

E o que é pior. As associações dos Magistrados têm de ir ao Congresso Nacional pedir reajuste para recuperar expressivas perdas inflacionárias que estão corroendo o orçamento de suas famílias. Têm de pedir apoio a políticos que não têm a mínima condição moral de ocupar um cargo público. E, agora, até mesmo a um palhaço, que inúmeros palhaços colocaram no Congresso. Vão e reivindicam seus direitos, mas os seus pleitos sequer são levados em consideração.

Esse quadro somente poderá ser alterado quando percebermos onde reside a debilidade do Poder Judiciário. Aí encontraremos o caminho para superar o seu descrédito, a apatia dos seus membros e a sua incompetência política. Caminho que passa, necessariamente, pela coesão interna, pela articulação política da base e pelo apoio da cúpula, do congresso e do povo.

Sem isso, nada propiciará que o Judiciário recupere o seu prestígio, a sua força e a sua condição de um dos poderes centrais da República, com um papel ativo e eficaz no combate à impunidade e na garantia dos direitos dos cidadãos.

Andrei Pitten Velloso - Juiz Federal e Doutor em Direito Tributário



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