Os corruptos perderam a timidez



Os corruptos perderam a timidez. Parafraseando Ministro que serviu aos três últimos governos (FHC, Lula e Dilma), é o que se conclui do noticiário a respeito do Departamento Nacional de Infraestura de Transportes (DNIT). Isso sem falar em tudo mais que tem se visto no país nos últimos anos. É o homem cordial, na sua versão fisiológica-partidária, quem dá as cartas na nossa República.

O escândalo do DNIT revela de forma até certo ponto didática as estranhas de um modelo no qual o preço da chamada governabilidade é a escancarada troca de cargos por apoio político. Nesse esquema, Partidos Nada-Republicanos são os grandes protagonistas. Para garantia de votos no Congresso, o governo loteia a máquina pública a grupos políticos cujo último interesse parece ser o público. Pior quando a maracutaia acontece justamente na pasta dos transportes, área em que o gargalo da infraestrutura exigiria uma gestão altamente eficiente e, é claro, livre de corrupção.

O modelo fisiológico parece se reproduzir na esfera estadual, onde, em meio a troca de sopapos, políticos da "base aliada" local acabaram revelando haver uma reserva de cargos para agraciamento de "correligionários", emblematicamente quantificada na soma dos salários a ser custeado pelo Estado [entenda-se contribuinte].

Se a existência desse balcão de negócios não chega a ser propriamente uma novidade, vê-lo exposto em detalhes é de arrepiar. Quando nos damos conta de que são os players desse jogo quem não só faz as leis, como também executa nossas políticas públicas, pensamos no quanto nossa democracia se afasta do ideal democrático de um governo que reflita a vontade do povo. Pois essa vontade, acredito eu, não é a de que as leis, em lugar de resultarem da livre discussão pública dos temas relevantes para a nação, sejam o produto de conchavos, na base do mais puro "é dando que se recebe". Tampouco que as políticas públicas reflitam os interesses de políticos de políticos e seus apadrinhados, em vez das necessidades da população.

Mas o pior mesmo é saber que a chance de algum dos envolvidos nesses esquemas ser responsabilizado em qualquer via - criminal, improbidade ou até mesmo politicamente - é mínima, para não dizer nula. Prerrogativas de foro, infindáveis recursos e bons advogados - pagos, em última análise, com dinheiro da própria vítima/ contribuinte - garantem que esse sistema perverso se perpetue, não havendo qualquer perspectiva de mudança, ao menos pelo que se extrai do discurso dominante não só entre políticos, mas no chamado meio jurídico nacional. Talvez seja simplesmente por isso que os corruptos perderam, definitivamente, a timidez.

Gueverson Farias
Juiz Federal



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