O que revelam os números do CNJ.



No último dia 29 o CNJ publicou o relatório anual Justiça em Números, com dados estatísticos alusivos à performance do Judiciário no ano de 2010 e aspectos acessórios como o fluxo da demanda e a taxa de congestionamento nos diversos ramos da Justiça.

Embora o estudo aponte que o ano de 2010 encerrou com aproximadamente 70% dos processos ajuizados pendentes de solução definitiva, o reverso da moeda nos permite concluir que 30% foram efetivamente resolvidos. Logo, se considerarmos ainda que esta última percentagem equivale à cifra de 25,4 milhões de processos, e mais, que ela não se refere apenas à quantidade de processos distribuídos no Judiciário em 2010, mas sim ao estoque total de feitos pendentes de solução aferido naquele ano, não se pode deixar de concluir que os magistrados brasileiros realizaram feito notável.

O relatório também revelou que a taxa de congestionamento mais elevada se situa na Justiça Estadual, sendo a maior parte nas varas de execução fiscal e não é preciso recorrer à mágica para explicar por que, comparativamente à Justiça Federal e à Justiça do Trabalho, os Juízes de Direito acabam sendo menos eficientes. A conclusão é uma só: JF e JT julgam mais porque estão mais bem providas de recursos materiais e humanos (servidores mais bem remunerados e em maior número) do que a Justiça dos Estados, evidenciando que nenhum ramo da Justiça logra cumprir a contento sua missão constitucional sem investimentos em estrutura e pessoal.

Tanto pior quando a maior taxa de congestionamento reside nas varas de execução fiscal, evidenciando que a falta de investimentos no Judiciário é duplamente nociva pois além de retardar o alcance da prestação jurisdicional aos cidadãos igualmente diminui a capacidade arrecadatória do Estado, que se vê desprovido de uma maneira eficaz de cobrar a dívida dos contribuintes inadimplentes.

Com efeito, ainda temos um descompasso entre a demanda da sociedade por justiça e a capacidade do Judiciário em provê-la, o que remete a incômodo questionamento sobre os motivos do congestionamento dos fóruns brasileiros: o problema está na falta de Juízes ou no excesso de processos?

Não errará quem opte por quaisquer das duas alternativas, dependendo de como queira compreender o problema e principalmente dependendo de como pretenda solucioná-lo. Podemos expandir indefinidamente o Judiciário até que tenhamos a relação Juízes/habitante semelhante a países do primeiro mundo, mas podemos igualmente questionar se o excessivo número de demandas não está a refletir problema sócio-político mais grave, relacionado ao mau funcionamento de nossas Instituições.

No Brasil, o acesso à Justiça é identificado como forma de exercício da cidadania. E efetivamente o é. Mas não deveria ser nem a primeira nem a melhor forma de fazê-lo, não devendo anteceder, nem em preferência, nem na freqüência, ações cidadãs outras como a acertada escolha dos parlamentares e dos governantes através do voto consciente. O problema é que no Brasil, pelo menos segundo a realidade da Justiça Federal, tanto o Governo, sonegando à população políticas públicas que provejam o alcance de direitos sociais mínimos, como o próprio Parlamento, sempre a reboque do Executivo, referendando pela via legislativa medidas fiscais notoriamente inconstitucionais, são os maiores geradores do excesso de demandas que congestionam o Judiciário.

O fato é que podemos aumentar o número de Juízes, profissionalizar a gestão do Judiciário, traçar metas de produtividade, aprimorar a legislação processual, otimizar o sistema de recursos contra as decisões e o que mais for, mas a decantada eficiência do Poder não virá dissociada de um amadurecimento de nossa democracia, ou seja, até que atinjamos um patamar de desenvolvimento onde o Judiciário não seja excessivamente onerado pelo próprio Poder Público na infindável faina de restabelecer o equilíbrio com as forças vivas da sociedade.

José Francisco Spizzirri
Juiz Federal Presidente da AJUFERGS
e Diretor de Relações Institucionais da AJUFE



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